- Já escolheu seu presente de Natal, Beto? Já escolheu? À
essa altura, saiba que seu delegado já foi lembrado pelo Papai Noel. O
superintendente dele, também. Até o promotor e o juiz já foram agraciados...
Não vejo por que um agente não pode também ganhar um presentinho.
- Se o Papai Noel está envolvido em sujeira, doutor, então
vou esperar meu presente de outro velhinho...
Carlos chegou em casa exausto. Ninguém lhe enfrentava, exceto
aquele inspetor de polícia medíocre, e isso vinha desde o primeiro dia em que
se cruzaram. Ainda irritado, abriu uma portinhola secreta do escritório,
escondida por um tapete suntuoso, e retirou de dentro algo que mantinha oculto
aos olhos de todos.
- Que é isso, papai? – perguntou o filho, que flagrou o pai
mexendo no compartimento secreto.
Um dossiê que pode me
pôr atrás das grades, pensou em dizer, mas ao invés disso, respondeu:
- Um álbum de fotografias, filho. Com tudo que eu já comprei
na vida.
O filho, curioso, sentou-se ao lado e pôs-se a folhear o
livro. Ele ficava assombrado com o que via. A cada página virada, a mesma
impressão esquisita de que as pessoas retratadas... eram reais! Não pareciam
apenas fotografias. Algumas vezes, percebeu que elas até piscavam ou moviam a
cabeça. Era um gesto quase imperceptível, mínimo. Mas verdadeiro. Bem
verdadeiro.
- Eu conheço este daqui – falou o menino.
- Sim, verdade. É um político importante de Brasília.
- E o senhor comprou ele, papai?
- Bem... tudo tem o seu devido preço.
- E existe algo que o senhor não tenha conseguido comprar?
Carlos pensou em Beto, o agente que ousara lhe dizer não.
- Filho, preste atenção no que vou lhe falar. É um sábio
ensinamento que herdei de seu avô: se não conseguir comprar algo ou alguém, é
por que não usou a estratégia certa. Se alguém não estiver à venda, compre o
irmão, a mãe, o tio, enfim... mas compre, porque comprar pode ser um bom investimento.
O menino concordou,
sem entender direito nem dar tanta importância. Apenas continuou folheando o
álbum até chegar a outras fotografias que falaram alto ao seu interesse.
- Ah, veja, papai, é a mamãe! Ela está segurando a mão... de
um policial? E na página seguinte, um bebê? Ora... sou eu!
Alexandre sorriu, satisfeito:
- É, filho, você vê? Sou mesmo um especialista neste mercado.
Cristiane Krumenauer é autora de Atrás do Crime, Chamas da Noite, Memória, Imaginação e Narração e da série Contos da Namíbia. |
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