A Maldição do Nome
Rio de Janeiro: Edições Galo Branco, 2011.
Olá, leitores fascinados pelas estimulantes estórias policiais. Hoje, tem matéria sobre Joaquim Rubens Fontes e sua obra A MALDIÇÃO DO NOME (Edições Galo Branco, 2011). Ele é autor premiado de nove livros e conhece como ninguém como escrever um bom mistério! Vamos a ele?
RESUMO:
Uma das tristes marcas herdadas pela República,
especialmente no interior, foi o coronelismo. Qualquer cabo eleitoral considerava-se
competente para controlar a vida das pessoas e nomear as autoridades
municipais, com poderes sobre a vida e a morte das pessoas. Bastava não ter
muito caráter, nem se importar com a ética, e ter prestígio junto aos homens do
governo.
Muitas cidades se tornaram feudos de famosos coronéis,
geralmente filhos de famílias importantes, que tinham forte ascendência sobre o
delegado, os vereadores, o prefeito, o juiz e, quase sempre, até sobre o
pároco. Para sobreviver, a população era convencida a adotar a política de não
se importar com eles, para não ser perturbada. Os poucos que se revoltavam eram
forçados a mudar de opinião, a calar ou a desaparecer da cidade, para fugir às
mais terríveis ameaças.
Inconformado com a perda de uma amiga, Da Mata, modesto
professor da escola, quis saber das circunstâncias do acidente que a vitimara e
acabou posto contra o exército inimigo. Mas não se intimidou. Ex-repórter,
conhece os segredos de uma investigação. A seu lado, apenas uma cadela, Kara,
cujo nome, lembrança de uma amaldiçoada princesa egípcia, leva pânico às hostes
inimigas. E Kara é realmente a heroína dessa aventura.
ANÁLISE
Em se tratando de literatura policial, parece ser
suficientemente agradável ao leitor o crime e a investigação que leva o
“detetive” a explorar os caminhos escusos até chegar a um culpado. No caso de
Joaquim Rubens Fontes, entretanto, tenho que frisar um quê a mais em seu
romance: a presença mística e, ao mesmo tempo, heroica de Kara, uma rottweiler que trata de uma questão sempre existente
quando o gênero literário é o policial. Refiro-me à ambiguidade bem e mal.
Kara, a linda rottweiler, representa em si toda essa disputa
constante entre o certo e o errado. Ela, por si só, é boa e má
concomitantemente, sendo, portanto, ambígua.
Por sua vez, Kara também não é apenas uma cachorra.
Simbolicamente, ela representa o corpo
do seu dono, o professor Da Mata,
bem como substitui as armas que ele não pode possuir por não ser um agente da
lei. Assim, quando as batalhas forem travadas, caberá a Kara não só proteger o
dono como também ajudá-lo a derrotar os inimigos fortemente armados.
Já Da Mata, o protagonista, vai atuar como o cérebro da investigação contra o crime
organizado, chegando mais longe que a própria polícia – corrupta, conivente com
os criminosos. Motivado a apenas desvendar os mistérios que levaram uma amiga a
morrer num acidente de automóvel, Da Mata vai descobrindo, passo a passo, uma
rede poderosíssima do crime. Não é segredo para o leitor: todos sabem de
imediato que os responsáveis são membros de uma tradicional família, os Floresta. O obstáculo maior, portanto,
não é desvendar a identidade dos bandidos, e sim, colocá-los atrás das grades
em um país em que o dinheiro compra impunidade.
Como você, leitor, deve ter percebido, os nomes das
personagens são bastantes simbólicos. De um lado, Da Mata – representando o bem
e o agente pensante. De outro, os Floresta – representantes do mal e também
agentes pensantes, embora o leitor não tenha acesso ao raciocínio deles, visto
o narrador acompanhar a estória a partir da visão do mocinho do enredo.
Refletindo sobre os nomes dos personagens, “Mata” consiste em um ambiente natural
onde alguém pode caminhar com alguma dificuldade, mas ainda assim com alguma
visibilidade. Comparando-se “mata” com “floresta”,
a última tende a ser repleta de árvores, normalmente com copas mais altas,
sendo mais escura e misteriosa.
Jean Chevallier e Bertrand, no Dicionário dos Símbolos (Ed. Teorema, 1994), discorrem sobre o último
termo:
Menos
aberta do que a montanha, menos fluida do que o mar, menos subtil do que o ar,
menos árida do que o deserto, menos escura do que a gruta, mas fechada,
enraizada, silenciosa, verdejante, sombria, nua, múltipla, e secreta, a
floresta de faias é arejada e majestosa; a floresta de carvalhos, nos grandes
caos rochosos, é céltica e druídica; a de pinheiros, nas encostas arenosas,
evoca um oceano próximo ou origens marítimas. E é sempre a mesma floresta.
(Bertrand d’Astorg).
Na literatura (...) a floresta gera angústia e serenidade,
símbolo de opressão e de libertação.
Talvez seja por tudo
isto que, em termos psicanalíticos, a floresta se encontra entre os grandes
símbolos do inconsciente. Se pensarmos nos contos de fadas, lendas e mitos de
muitas tradições, ou no folclore popular do mundo inteiro, veremos que neles
abundam imagens de florestas que devem ser percorridas, atravessadas, e
desvendadas nos seus caminhos labirínticos.
Assim, cabe a Da Mata percorrer os labirintos do planejamento
do crime até chegar aos verdadeiros chefes do poder, os Floresta, tendo que trilhar
um caminho obscuro e repleto de perigos para que seu propósito se concretize.
E, enquanto o mocinho vai fazer essa trajetória do
pensamento (afinal, ele simboliza o cérebro), sua cachorra Kara vai atuar com o
corpo. Ambos, unidos, tornam-se uma arma infalível, à altura do crime
organizado, e terão condições de derrotá-lo.
SOBRE O AUTOR:
Mineiro residente no Rio de Janeiro, Joaquim Rubens
Fontes é Bacharel em Jornalismo e Letras, com especialização em Português e
Filosofia Medieval. É Mestre e Doutor em Literatura Brasileira.
Trabalhou como repórter policial no jornal Gazeta de Notícias, no Rio de
Janeiro. Foi por 31 anos, funcionário do Banco do Brasil. Lecionou no curso de
Letras da Universidade Santa Úrsula.
Tem nove
livros publicados, sendo um técnico e uma pesquisa de pós-doutorado. Sua
produção literária já lhe rendeu oito prêmios.
***
Antes de encerrar, gostaria de agradecer ao Joaquim, pois,
enquanto esta matéria aguardava o momento certo para ser publicada, eis que recebo
um presente lindo (e bastante útil, por sinal). Ah, eu adoro os Correios rsrs.
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